Paz e Bem.
Na Audiência Geral, o Papa Francisco deu continuidade a suas catequeses sobre o tema da velhice, propondo o exemplo de Moisés que, no fim de seus dias, proclama o nome do Senhor, transmitindo às novas gerações a herança de sua história vivida com Deus. Como seria bonito, afirma o Papa, se a transmissão da fé ainda se realizasse assim, pela boca dos idosos.
“Porque vou proclamar o nome do Senhor, dar glória ao nosso Deus. Ele é o Rochedo, perfeita é a sua obra, justos todos os seus caminhos; é Deus de lealdade, não de iniquidade, ele é justo, ele é reto. (Dt 32, 3-4)”
Moisés tinha cento e vinte anos, segundo o relato bíblico, no momento em que pronunciou este cântico e estava no limiar da terra prometida e no final de sua vida. O cântico é uma confissão de fé, afirma o Papa, com a qual transmite a experiência com Deus aos seus descendentes. Poder fazer isso, diz Francisco, é um grande dom para os jovens:
Escuta pessoas e direta da história é insubstituível
A escuta pessoal e direta da história, da história de fé vivida, com todos os seus altos e baixos, é insubstituível. Lê-la em livros, assisti-la em filmes, consulta-la na internet, por mais útil que seja, nunca mais será a mesma coisa. Esta transmissão – que é a verdadeira tradição! – a transmissão concreta do idoso ao jove, faz muita falta esta transmissão hoje, e ssempre mais, às novas gerações. Por quê? Porque esta civilização novo tem a ideia de que os idosos são material de descarte, os velhos são descartados. Esta é a brutalidade! Não, não está certo! A narrativa direta, de pessoa para pessoa, tem tons e formas de comunicação que nenhum outro meio pode substituir.
Francisco se pergunta se hoje somos capazes de reconhecer e de honrar esse dom que vem dos idosos ou se, antes, tentamos prescindir dele e observa que alguns gostariam até mesmo de “abolir o ensino da história, como uma informação supérflua sobre mundos que não mais atuais, que tira recursos do conhecimento do presente”.
Os idosos, memória viva de um povo
Posso dar um testemunho pessoal. Aprendi o ódio e a raiva à guerra com meu avô que combateu no Piave, em 14 (1914), e ele me transmitiu essa raiva à guerra. Porque ele me contou sobre os sofrimentos de uma guerra. E isso não se aprende nem nos livros ou em outro lugar… aprende-se assim, transmitindo-a dos avós para os netos. E isso é insubstituível. A transmissão da experiência de vida dos avós para os netos. Hoje infelizmente não é assim e pensamos que os avós são material de descarte: não! Eles são a memória viva de um povo e os jovens e as crianças devem ouvir seus avós.
O Papa constata depois que muitas vezes à transmissão da fé “falta a paixão própria de uma ‘história vivida'”. Portanto, carece de capacidade atrativa:
Certo, as histórias de vida devem ser transformadas em testemunho, e o testemunho deve ser leal. A ideologia que curva a história a seus próprios padrões certamente não é correta; a propaganda, que adapta a história à promoção do próprio grupo, não é correta; não é correto fazer da história um tribunal em que todo o passado é condenado e se desencoraja todo futuro. Não. Ser leal é contar a história como ela é, e só quem a viveu pode contá-la bem. Por isso é muito importante ouvir os velhos, ouvir os avós: que as crianças conversem com eles.
Os próprios Evangelhos narram honestamente a história abençoada de Jesus sem esconder os erros, as incompreensões e até mesmo as traições dos discípulos. Esta é a história, é a verdade, isso é testemunho. Este é o dom da memória que os “anciãos” da Igreja transmitem, desde o início, passando-o “de mão em mão” à geração seguinte.
A fé se transmite “em dialeto”
Fará bem nos perguntarmos: quanto valorizamos esta forma de transmitir a fé, passando o bastão entre os anciãos da comunidade e os jovens abertos ao futuro?
E aqui me vem em mente algo que já disse muitas vezes, mas gostaria de repetir. Como a fé é transmitida? “Ah, aqui está um livro, estude-a”: não! Assim, a fé não pode ser transmitida. A fé se transmite em dialeto, ou seja, na fala familiar, dos avós aos netos, entre pais e netos. A fé é sempre é transmitida em dialeto, naquele dialeto familiar e experiencial dos anos. Por isso é tão importante o diálogo em família, o diálogo das crianças com os avós que são aqueles que têm a sabedoria da fé.
Reevocar com comoção as bênçãos de Deus
Às vezes, eu reflito sobre essa estranha anomalia. O catecismo da iniciação cristã baseia-se generosamente na Palavra de Deus e transmite informações precisas sobre dogmas, sobre a moral da fé e sobre os sacramentos. Mas muitas vezes, porém, falta um conhecimento da Igreja que nasce da escuta e do testemunho da história real da fé e da vida da comunidade eclesial, desde os primórdios até os dias de hoje. Quando crianças aprendemos a Palavra de Deus nas salas de catecismo; mas a Igreja se “aprende” quando jovens, nas salas de aula e nos meios de informação globais.
A narração da história da fé deveria ser como o Cântico de Moisés, como o testemunho dos Evangelhos e dos Atos dos Apóstolos. Ou seja, uma história capaz de reevocar com comoção as bênçãos de Deus e com lealdade as nossas falhas.
Seria belo se houvesse, desde o início, nos itinerários catequéticos, também o hábito de ouvir a experiência vivida pelos idosos, a lúcida confissão das bênçãos recebidas de Deus, que devemos guardar, e o testemunho sincero de nossas faltas de fidelidade, que devemos reparar e corrigir.
Os anciãos entram na terra prometida, que Deus deseja para cada geração, quando oferecem aos jovens a bela iniciação do seu testemunho. Então, guiados pelo Senhor Jesus, idosos e jovens entram juntos no seu Reino de vida e de amor.
“O Senhor disse [a Moisés]:” Esta é a terra que prometi a Abraão, Isaque e Jacó, “‘Verás, pois, defronte de ti a terra que darei aos israelitas, mas não entrarás nela!'”
Fonte: Vatican News | Adriana Masotti