Paz e Bem!
Se você estava com saudades do nosso espaço cultural e histórico de todas as semanas, não precisa ficar saudoso. Todas as sextas-feiras temos um compromisso com a história e muitas pessoas esperam ansiosamente saber o que “Aconteceu na Penha” ao longo dos anos. Nos últimos dias estávamos nas celebrações de Natal e Ano Novo, e por isso, deixamos para reiniciar a cronologia dos fatos que marcaram a história, agora, na primeira sexta-feira útil do ano.
Há mais de quatro séculos e meio, o povo do Estado do Espírito Santo celebra sua padroeira com muito amor e notoriedade, além da fortíssima expressão devocional à Mãe de Jesus, sob o título de Senhora das Alegrias da Penha. Por tamanha devoção, estamos destacando os aspectos históricos da religiosidade local, em reportagens, resgates cronológicos de fatos ocorridos no Convento. Já conhecemos, por exemplo, como se deu a construção do Santuário desde a chegada do fundador da devoção à Nossa Senhora da Penha em solo capixaba, já vimos um pouco da história do Frei Pedro Palácios, inclusive que morreu com fama de santidade. Também há registros no nosso site sobre as primeiras romarias ao Convento.
E não parou por aí… Ao longo dos meses, nos encantamos com muitas histórias bonitas que ocorreram e que tiveram a intercessão de Nossa Senhora da Penha, como a primeira vez que a Imagem original de Nossa Senhora saiu do Convento… Também já conhecemos como ocorreu a ampliação do Santuário para Convento (residência dos freis) e até tivemos acesso à escritura de doação da Montanha Sagrada para os franciscanos.
Hoje vamos voltar ao ano de 1730. Aconteceu na Penha… Em 1730, Frei Apolinário da Conceição (Irmão Leigo da Província Franciscana da Imaculada Conceição do Brasil) atesta que os “romeiros concorrem de todos os estados”, ou seja, é o início da peregrinação mariana em volumes consideráveis. Vale lembrar que em 1717, ocorreu no Rio Paraíba do Sul, São Paulo, a aparição da Imagem de Nossa Senhora Aparecida. Naqueles tempos, já havia registros de romarias ao Convento da Penha em Vila Velha, no entanto, apenas de pessoas de cidades locais.
Frei Apolinário destacou ainda a presença de uma quantidade grande de frades, 23 no total. “Assistem aqui como capelães e serventes desta Senhora, 23 religiosos que, cultivando o coro nas horas do dia, não faltam nunca ao da noite”. No seu tempo, Nossa Senhora continuava a operar prodígios e acrescenta piedosamente que por este motivo, muitos de vários cantos, iam “visitar a sua sagrada Imagem, uns a pedir, outros a agradecer; e nenhum deixa de se elevar na sua presença, parecendo-lhe estaria já de posse da bem-aventurança e que quem logra esta, não tem mais que apetecer: quem chegou a gostar da assistência neste devoto Santuário parece-lhe que no mundo não há mais que desejar’.”
Segundo a história, os romeiros vinham de toda a parte a nos dias de festa ou nos dias comuns. Muitos deles, principalmente de Campos-RJ, “vinham, em romaria, ‘pagar promessa’. Demoravam às vezes seis meses pais e filhos – entregues aos mais rudes trabalhos: amassar barro, cavoucar, derribar mato, desbastar madeira, transportar materiais para o cume etc.”
Eram verdadeiros mutirões ou ajutórios que congregavam, no monte sagrado, ou suas redondezas, devotos de todos os recantos, trabalhando contritos para Nossa Senhora da Penha.
Não diz outra coisa o povo, à sua maneira e no seu lirismo religioso, expresso nesta trova cantada pelos congueiros de Caieira Velha (Aracruz):
Fui ao Convento da Penha Visitar
Mamãe querida
Agora posso dizer
Que já fui ao Céu em vida…
O jantar de Deus
Como não consta o ano em que se deu, sendo, porém, certo que foi antes de 1730, inserimos aqui um fato edificante, descrito em “O Convento de N. Senhora da Penha do Espírito Santo, ano 1965”, dos Freis Basílio Rower e Alfredo W. Setaro – compilação de Walter der Aguiar Filho, abril/2015.
“Mandara o Guardião da Penha, dois Religiosos à Vila da Conceição de Guarapari a tratar de um negócio importante que não permitia demora. Os frades puseram-se a caminho e andaram em jejum todo o dia ao longo da praia. Cedo caiu a noite, por causa de grande tempestade, com horrível trovoada. Chegando perto da vila, não encontraram quem os quisesse levar por uma passagem que só a canoa se podia atravessar. Um dos companheiros, então, mais prático do lugar, sugeriu a idéia de irem por outro caminho, que na distância de um quarto de légua encontrariam a casa de um pobre, mas caridoso homem. Caminharam, pois, todo molhados, e fuzis e relâmpagos serviam-lhes de farol e guia. O pobre homem recebeu-os caridosamente, mas significou-lhes com grande pesar que nada tinha para oferecer, e os dois tinham andado quase dez léguas sem comer. Acudiu a Providência Divina. Ainda estavam dando graças a Deus pela fome que sentiam quando escutaram reboliço nas palhas do telhado e uma coisa caiu pesadamente no chão da casa. Chegaram-se com luzes, era o jantar que Deus lhes enviou, um bom dourado. Prepararam-no e fartaram-se eles e o homem pobre, mas hospitaleiro. Voltando ao Convento e ouvindo os Religiosos o acontecido, todos deram muitas graças ao Senhor.”
Alguns trechos foram extraídos do Livro dos Romeiros de 1847; “História Popular do Convento da Penha”, 3ª edição 2008 (Guilherme Santos Neves); Livro “O Convento da Penha”, de Norbertino Bahiense (1951).