Aconteceu na Penha em 1856

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Paz e Bem!

Sempre às sextas-feiras conhecemos um pouco mais sobre a tradição, a história e a expressão de fé do povo capixaba através do aspectos históricos da religiosidade local. São pequenas reportagens de fatos que aconteceram na Penha.

Já conhecemos como se deu a construção do Santuário de Nossa Senhora da Penha, e ao longo do tempo, estamos entendendo como ele se tornou um dos mais importantes templos marianos do país. Sabemos que até o ano de 1750, o Convento da Penha passou por muitas transformações, sendo intervenções necessárias por conta da deterioração do tempo e também ampliações para acolher melhor frades e visitantes.

Já explicamos como ocorreu a crescente expressão de devoção à Nossa Senhora da Penha. Falamos de romarias, dos primeiros romeiros vindos de outros estados e até da primeira Festa da Penha da história. Também já lembramos como e por qual motivo a Imagem Nossa Senhora da Penha saiu do Convento em procissão. Isso Aconteceu na Penha em 1669, quando pela primeira vez a Imagem original de Nossa Senhora da Penha sai do Altar e vai em procissão até a capitania do Espírito Santo, atual cidade de Vitória.  O motivo foi para debelar uma terrível epidemia. Foi no fim do século XVII. Ele se fechava entre os horrores cruéis de violenta epidemia e o povo, apavorado, voltava-se para os céus em preces aflitas. Assim, foram buscar no Santuário da Penha, a milagrosa imagem, trazendo-a até Vitória.

Viagem de Nossa Senhora da Penha a Vitória, de 1769 – (Gravura do Século XIX – Oferta da Sra Maria de Lourdes Melo Silva)

Aconteceu na Penha… Em 1856 durante a epidemia do cólera-morbo, a Imagem do Menino Jesus da Penha seguiu em procissão para Vitória e Serra. O objetivo da procissão era de debelar a terrível situação que estava ceifando a vida de muitas pessoas no Brasil e em todo o mundo.

A epidemia de cólera-morbo na Rússia, que começou em 1847, prolongou-se até 1851, matando mais de um milhão de pessoas. Foi o terceiro grande surto de cólera com origem na Índia no século XIX e que se alastrou muito para além das suas fronteiras. Entre 1853 e 1864, a epidemia em Londres ceifou mais de 10.000 vidas e houve mais de 23.000 mortes em toda a Grã-Bretanha. A doença atingiu a América do Sul, entre 1854 e 1856, provocando vítimas na Venezuela e no Brasil.

Por conta da intensificação do comércio marítimo, em poucos meses havia doentes em todas as províncias do Norte e Nordeste do Brasil, e também no Rio de Janeiro, capital do Império, acometidos com cólera-morbo, originário da Índia.

Cólera-morbo é uma doença infecciosa aguda, epidêmica, marcada por intensa diarreia aquosa, cãibras, prostração e anúria, causada pelo Vibrio cholerae, que se transmite principalmente pela água. A cólera é fatal se não for tratada imediatamente. Raramente, choque hemorrágico (quando uma pessoa perde mais de 20% do sangue ou fluído corporal) e convulsões podem ocorrer em casos graves.

Assim escreve Maria Stella de Novaes em “O Relicário de um povo – O Santuário de Nossa Senhora da Penha, 2ª edição, 1958”:

Vivia o povo sempre temeroso das epidemias que martirizavam, periodicamente os habitantes de Vitória. Varíola, febre amarela, bubônica! … Em 1856, irrompeu o cólera morbo e alastrou-se rapidamente. Dizem as crônicas da “Província do Espírito Santo” que passavam pelas ruas oito, doze, dezesseis cadáveres, transportados pelos galés. Aterradas, as famílias gritavam, das janelas! — Misericórdia, meu Deus! Socorrei vosso povo”!

Mas, se o povo é naturalmente religioso, na rotina cotidiana, afervora-se na cadinho do sofrimento. Voltou-se para Nossa Senhora da Penha e, em procissão, trouxe o Menino Jesus até Vitória e a Serra. No “Correia da Vitória”, de 30 de Janeiro de 1856, Frei Valadares convidava o povo para receber a referida imagem, que regressava da Serra e devia permanecer, no Convento de São Francisco, de 1 a 2 de Fevereiro.

No dia 4 do mesmo mês, a coroa de Nossa Senhora da Penha foi, em procissão, até Carapina.

Surgiram, naturalmente, evidências das vibrações poéticas da alma popular, produções que permaneceram aliando a sensibilidade dos seus autores anônimos ao registro da passagem histórica. Temos assim a Glosa da Coroa, recolhida em nossas pesquisas folclóricas:

Nossa Senhora da Penha
não veio, porém, mandou
sua sagrada coroa
e a impidemia passou.

Corre sangue em borbotão,
nas chagas de Jesus Cristo;
pro erro dos seus ministro,
maior lançada lhe dão.
A Deus pidindo perdão,
mentre castigo num venha,
sendo Mãe do Onipotente,
Ela a nós compaixão tenha,
tenha dó dos inocente,
Nossa Senhora da Penha.

No Santuário, em louvô,
tem seus milagres pintado
e, em cera, representado
aqueles que Ela curô,
pidindo a Nosso Senhô
pro muita bondade e amô,
que a seu povo, em embaraço,
acolhesse, em seu regaço,
pelo santo resplendô
que Ela, não veio mandô.

Houve uma missa cantada
e uma procissão de vela
que parecia de estrela,
cum ladainha entoada,
que foi inté Carapina.
Houve muito sarva boa,
pois que só viu da Senhora
pela bondade divina,
sua sagrada coroa.

Na vila martirizada,
os mais nobres cidadão
acharo o tempo sagrado
de fazê a procissão,
os cujos nome eu num sei,
pru que num pude conta
os que foram acompanha
prenda que a Virgem mandô,
e quando Ela entrô na igreja,
a impidemia passou.

Alguns trechos foram extraídos do Livro dos Romeiros de 1847; O Relicário de um povo – O Santuário de Nossa Senhora da Penha, 2ª edição, 1958 – de Maria Stella de Novaes, site morrodomoreno.com.br

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